Índice de Comorbidades de Charlson
O Índice de Comorbidade de Charlson (ICC) foi desenvolvido em 1987 pela Dra. Mary E. Charlson e colaboradores, com o objetivo de criar uma ferramenta capaz de predizer a sobrevida de pacientes em estudos longitudinais, a partir das comorbidades que os acometem.
No estudo original, o ICC foi desenvolvido empiricamente com dados de uma coorte de pacientes internados em enfermarias de clínica médica. Todas as comorbidades foram consideradas, com exceção daquelas já resolvidas (como infecções passadas ou cirurgias previamente realizadas). Cada condição clínica foi classificada como ausente ou presente, sendo ainda estratificada conforme sua gravidade. Observou-se que, quanto maior o número e a gravidade das comorbidades, menor era a sobrevida do paciente ao longo de um ano (medida em meses).
Uma segunda coorte, composta por mulheres com câncer de mama, foi avaliada com o objetivo de validar o índice em um acompanhamento de até 10 anos. Os resultados foram semelhantes, com um achado relevante: o impacto significativo da idade na sobrevida. Nesse estudo, a idade foi categorizada por décadas de vida, sendo atribuído um ponto adicional ao escore a cada década acima dos 40 anos. Esses achados foram confirmados em um estudo de validação subsequente com pacientes submetidos a cirurgias eletivas.
O ICC considera 19 comorbidades, cada uma com um peso específico. O escore final é a soma dos pesos atribuídos às comorbidades presentes, acrescida do fator idade.
O índice já foi aplicado a pacientes com diversas condições clínicas, como neoplasias (mama, próstata, pulmão, colorretal etc.), acidente vascular cerebral (AVC), síndrome coronariana aguda, arritmias, insuficiência cardíaca, COVID-19, demências, fratura de quadril, traumas e após procedimentos cirúrgicos variados. Também foi validado em múltiplos contextos de atendimento: unidades de terapia intensiva (UTI), prontos-socorros, internações hospitalares e centros cirúrgicos.
Além disso, o ICC foi adaptado para uso com o Código Internacional de Doenças (CID), e estudos foram realizados com base em diferentes fontes de informação: entrevistas diretas com pacientes, prontuários médicos, resumos de alta hospitalar e listas de problemas clínicos.
O Índice de Comorbidade de Charlson é amplamente utilizado para estimar o risco de mortalidade, mas também tem sido associado a outros desfechos clínicos, como o tempo de internação, complicações pós-operatórias e o risco de admissão em unidades de reabilitação.
Uma das principais críticas ao ICC refere-se à necessidade de recalibração dos pesos das comorbidades, considerando os avanços da medicina ao longo das décadas. Desde sua criação, houve importantes melhorias diagnósticas e terapêuticas que impactam significativamente a sobrevida de pacientes — especialmente em casos como neoplasias e HIV/AIDS.
1. Infarto do miocárdio:
Pacientes com hospitalização – atual ou passada – com alteração eletrocardiográfica e/ou enzimática compatível com infarto do miocárdio.
2. Insuficiência cardíaca:
Pacientes com história de dispnéia aos esforços, dispnéia paroxística noturna e que apresentaram resposta sintomática ou no exame físico ao tratamento com diuréticos, digitálicos ou redutores da pós-carga.
3. Doença vascular periférica:
Pacientes com claudicação intermitente ou que foram submetidos a by-pass por insuficiência arterial, aqueles com gangrena ou insuficiência arterial aguda e aqueles com aneurismas de aorta torácica e abdominal não tratados, 06cm ou mais.
4. Doença cerebrovascular:
Pacientes com história de AVC ou AIT, oclusões vasculares da retina e todas doenças cerebrovasculares. Se sequela hemiplégica, marcar apenas hemiplegia.
5. Demência:
Pacientes com déficit cognitivo crônico moderado a grave resultando em perda funcional e de qualquer etiologia.
6. Doença pulmonar crônica:
Pacientes com doenças crônicas das vias aéreas inferiores: bronquite, enfisema, asma, bronquiectasia e doenças causadas por agentes externos que apresentem sintomas como dispneia ou tosse, durante atividade leve a moderada.
7. Doença do tecido conjuntivo:
Pacientes portadores de Lúpus eritematoso sistêmico, Doença Mista do Tecido Conjuntivo, Polimiosite, Polimialgia Reumática, sarcoidose, síndrome de Sjögren ou qualquer vasculite sistêmica.
8. Doença ulcerosa péptica:
Pacientes com passado de tratamento por úlcera péptica, incluindo aqueles com sangramento prévio pela úlcera.
9. Doença Hepática:
Leve – pacientes com cirrose, mas sem hipertensão porta ou hepatite aguda (1 ponto); Moderada a grave – pacientes com cirrose e hipertensão porta e/ou história de sangramento por varizes, presença de ascite, icterícia crônica, transplantados (3 pontos)
10. Diabetes:
Sem complicações – pacientes tratados com insulina ou antidiabéticos orais, mas não os controlados apenas com dieta, não inclui diabetes gestacional (1 ponto); Lesões de órgãos-alvo – neuropatia, nefropatia, retinopatia, hospitalização prévia por cetoacidose, coma hiperosmolar (2 pontos)
11. Hemiplegia:
Pacientes com hemiplegia ou paraplegia, tenha ocorrido por doença cerebrovascular ou outras causas.
12. Doença renal severa ou moderada:
Pacientes com creatinina >3 mg/dl ou em diálise ou transplantados ou em uremia.
13. Tumores sólidos:
(incluindo mama, cólon, pulmão, próstata e outras variedades de tumor). Sem metástases (2 pontos), Com metástases (6 pontos)
14. Leucemia/Policitemia Vera:
Pacientes com LMA, LMC, LLA, LLC ou Policitemia Vera.
15. Linfoma/mieloma:
Pacientes com Hodgkin, linfosarcoma, macroglobulinemia de Waldenstrom, mieloma e outros linfomas.
16. Pacientes com HIV/AIDS:
Pacientes com diagnóstico definitivo ou provável.
17. Idade:
Escolha a faixa etária do paciente:
Interpretação*:
Os estudos originais do Índice de Comorbidade de Charlson avaliaram a sobrevida em dez anos do indivíduo, a partir das seguintes pontuações:
Estimativa de sobrevida em dez anos
Zero ponto: 98%
Um ponto: 96%
Dois pontos: 90%
Três pontos: 77%
Quatros pontos: 53%
Cinco pontos: 21%
Seis pontos: 2%
Sete ou mais pontos: 0%
Ressalta-se que, mais importante do que avaliações e classificações pontuais, é a aplicação seriada do instrumento e o julgamento quanto a variações ao longo do tempo.
* Salienta-se que os instrumentos de avaliação geriátrica devem ser utilizados em conjunto com anamnese e exame físico. Devendo ser interpretados sob a luz de julgamento clínico
Referências:
Charlson ME, Pompei P, Ales KL, MacKenzie CR. A new method of classifying prognostic comorbidity in longitudinal studies: development and validation. J Chronic Dis 1987; 40(5): 373-83. doi: 10.1016/0021-9681(87)90171-8.
Charlson ME, Szatrowski TP, Peterson J, Gold J. Validation of a combined comorbidity index. J Clin Epidemiol 1994; 47(11): 1245-51. doi: 10.1016/0895-4356(94)90129-5.
Charlson ME, Carrozzino D, Guidi J, Patierno C. Charlson Comorbidity Index: A critical review of clinimetric properties. Psychother Psychosom 2022; 91(1): 8-35. doi: 10.1159/000521288.