Escala Cornell de Depressão na Demência (ECDD)
Os transtornos de humor e as síndromes cognitivas são condições comuns na população idosa, muitas vezes coexistentes e de difícil diferenciação. Não é raro que um quadro depressivo seja a manifestação inicial de demência, ou que um transtorno de humor simule um quadro demencial. Além disso, um histórico de depressão é um fator de risco significativo para o desenvolvimento de demências.
A maioria dos instrumentos utilizados para a avaliação do humor baseia-se nas informações fornecidas pelo paciente. Contudo, essa coleta de dados pode ser prejudicada em pacientes com déficit de memória ou dificuldades de julgamento. Para suprir essa limitação, foi proposta a Escala Cornell de Depressão na Demência (ECDD), que obtém informações tanto de cuidadores quanto por meio de uma entrevista breve com o paciente.
A ECDD foi desenvolvida por pesquisadores da Universidade de Cornell (Alexopoulos et al., 1988) e originalmente chamada Cornell Scale for Depression in Dementia. Trata-se de um questionário com dezenove itens, especificamente desenhado para estratificar os sintomas de depressão em pacientes com demência, principalmente com base na observação clínica. A escolha dos sintomas foi feita a partir dos critérios presentes na Hamilton Rating Scale for Depression.
Cada sintoma é classificado em três categorias: ausente (zero pontos), leve ou intermitente (um ponto) e grave (dois pontos). A pontuação total varia de 0 a 38 pontos. O questionário avalia sintomas depressivos ocorridos na última semana. Para os itens 8 (perda de interesse) e 11 (falta de energia), deve-se especificar se os sintomas começaram há menos de um mês. O avaliador pode esclarecer o significado de cada item durante a aplicação da escala.
A avaliação é realizada em dois momentos: primeiramente, o examinador aplica o questionário ao cuidador; em seguida, realiza uma entrevista com o paciente, baseada nas questões investigadas, mas não se limitando a essas. Caso haja uma grande discrepância entre as duas avaliações, o examinador deve consultar o cuidador novamente para esclarecimentos. Após esse processo, a pontuação final é determinada com base no julgamento clínico.
Brown et al. (2015) sugerem que o instrumento seja utilizado para pacientes com quadros demenciais moderados a graves, com pontuação no Mini-Exame do Estado Mental (MEEM) abaixo de 15 pontos. Para pacientes com pontuações mais altas, é recomendada a utilização da Escala de Depressão Geriátrica (Yesavage).
A ECDD é útil tanto para rastrear sintomas depressivos quanto para avaliar a gravidade do quadro, além de ser eficaz no acompanhamento da resposta ao tratamento. No entanto, é importante destacar que a ECDD não foi originalmente projetada para o diagnóstico de quadros depressivos. Em uma metanálise, Goodarzi et al. demonstraram uma sensibilidade de 84% e uma especificidade de 80% para a ECDD ao avaliar idosos em comunidade, com dados semelhantes encontrados por Atchison et al.
Embora a ECDD seja uma ferramenta interessante para a avaliação de sintomas depressivos em pacientes com demência, ela apresenta algumas desvantagens. O tempo de aplicação é relativamente longo (entre 20 e 30 minutos), o que pode ser um desafio dentro de uma consulta com múltiplas demandas. Por fim, a ECDD parece ser menos eficaz em quadros demenciais muito avançados.
Escala Cornell de Depressão na Demência (ECDD)
Interpretação*:
A interpretação proposta para a ECDD é a seguinte:
Abaixo de 06 pontos: ausência de sintomas depressivos significativos
Acima de 10 pontos: provável episódio de desordem depressiva maior
Acima de 18 pontos: episódio definitivo de depressão maior
Ressalta-se que, mais importante do que avaliações e classificações pontuais, é a aplicação seriada do instrumento e o julgamento quanto a variações ao longo do tempo.
* Salienta-se que os instrumentos de avaliação geriátrica devem ser utilizados em conjunto com anamnese e exame físico. Devendo ser interpretados sob a luz de julgamento clínico
Referências:
Alexopoulos GS, Abrams RC, Young RC, Shamoian CA. Cornell Scale for Depression in Dementia. Biol Psychiatry 1988; 23(3): 271-84. doi: 10.1016/0006-3223(88)90038-8.
Atchison KA, Nazir A, Wu P, Seitz D, Wat JA, Goodarzi Z. Depression detection in dementia: A diagnostic accuracy systematic review and meta analysis update. Health Sci Rep 2024; 7(11): e70058. doi: 10.1002/hsr2.70058.
Brown EL, Raue PJ, Halpert K. Evidence-based Practice Guideline: Depression Detection in Older Adults With Dementia. J Gerontol Nurs 2015; 41(11): 15-21. doi: 10.3928/00989134-20151015-03.
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